Afinal, qual era a função do Dunga?
A recente eliminação da seleção brasileira de futebol da Copa do Mundo tem motivado as mais variadas interpretações. Uma figura, em especial, constitui o alvo dessas análises: o treinador Dunga. Sua inexperiência, a falta de técnica nos tempos de jogador ou ainda a incapacidade de lidar com as pressões da imprensa; abundam razões para desqualificar o trabalho daquele que, segundo se dizia há quatro anos, chegava para por ordem na casa. Nossa proposta é discutir o papel do comandante em uma equipe; em outras palavras, para que servem os técnicos, os gerentes, enfim, a figura do chefe?
Respeitando a lógica da divisão do trabalho, não pretendemos rivalizar com os cronistas esportivos pela construção de uma teoria para o fracasso da seleção. De nossa parte, a combinação de um limitado conhecimento do tema com a descrença em relação à pureza do futebol faz com que uma análise baseada em aspectos meramente esportivos esteja fadada ao fracasso. Nossa proposta é discutir o papel do comandante em uma equipe; em outras palavras, para que servem os técnicos, os gerentes, enfim, a figura do chefe?
Monitoria e coordenação
Um tema que desafia os pesquisadores é a determinação de uma lógica para a ação coordenada na esfera social. Sem entrar nos pormenores do debate, hoje a maioria da comunidade acadêmica reconhece que os chamados custos de transação são um fator central na explicação da organização humana. Estes se fazem presentes em distintos contextos, e é importante notar que inexiste uma teoria capaz de unificar todos os desdobramentos de sua existência. Nada que impeça a discussão de problemas especÃficos, como o papel dos supervisores na rotina econômica.
A magnitude dos custos de transação em uma ação coordenada explica tanto a função desempenhada por um supervisor como a forma como as pessoas são recompensadas por seu esforço. Em um cenário desprovido de custos de transação, seria possÃvel determinar com exatidão a contribuição individual para o resultado final do trabalho. Dessa maneira, o chefe se limitaria a coordenar as atividades da equipe, auxiliando-a a tirar o melhor proveito possÃvel dos benefÃcios do trabalho conjunto.
Por uma série de razões, porém, a situação é mais complexa no mundo real. Em primeiro lugar, a existência dos custos de transação faz com que raramente seja possÃvel mensurar com exatidão a participação individual em uma ação cooperativa. O supervisor, dessa forma, assume a missão de monitorar o esforço de cada membro da equipe, determinando as respectivas recompensas. Inclusive, muitas vezes esse pagamento é feito por meio de um critério menos trabalhoso: daà o porquê de os salários geralmente serem fixados segundo o número de horas, e não de acordo com cada atividade desempenhada ao longo do mês.
Um chefe, portanto, possui múltiplas funções na tarefa de comandar uma equipe. Tendo em vista um objetivo definido, este deve coordenar os indivÃduos de modo a facilitar a interação coletiva. Igualmente, tem a prerrogativa de mensurar o esforço de cada integrante da equipe, determinando as recompensas respectivas. Conforme visto aqui, essa necessidade de monitoramento varia de acordo com a magnitude dos custos de transação, ou, em outras palavras, da dificuldade de mensuração da contribuição individual.
Dunga: monitor ou coordenador?
O transplante das ideias expostas acima para o campo futebolÃstico exige alguma abstração. No caso da seleção a recompensa recebida pelos jogadores é a participação na Copa, algo que não se traduz explicitamente em termos monetários. Além disso, uma equipe de futebol produz algo intangÃvel, que é a qualidade do jogo apresentado. Não entraremos na discussão acerca da importância da vitória para a percepção humana sobre a qualidade de um time; as evidências mostram, porém, que é melhor perder jogando bonito do que com uma atuação medÃocre. Ou seja, a excelência é sempre a melhor resposta.
Ao assumir a seleção brasileira de futebol, o discurso de Dunga era claro: seu objetivo era o de resgatar o orgulho na seleção brasileira. Para isso, baseou-se em um conjunto de valores que considerava fundamentais para o êxito da equipe, subordinando as convocações a essa interpretação. Como resultado, não foram poucos os jogadores esquecidos pelo treinador por apresentarem um comportamento considerado incompatÃvel com a tradição da camisa verde e amarela.
Agindo dessa maneira, Dunga privilegiou o monitoramento em seu trabalho. Por trás da referência constante à busca por "coerência", o treinador criou um critério pessoal para mensurar a contribuição potencial de cada jogador, determinando as recompensas segundo essa medida. A prerrogativa da coordenação, ou seja, da organização da equipe no campo de jogo, dava-se após a determinação do perfil ideal de seus membros.
Pois bem, a pergunta que fazemos é: será tão difÃcil mensurar a contribuição potencial de um jogador de futebol? Era necessária a criação de um critério tão pessoal quanto o "comprometimento" para a determinação do grupo que foi à Copa? Embora a subjetividade jogue aqui o seu papel, suspeitamos que, no conjunto, a resposta seja negativa. Afinal, o principal objetivo do trabalho coletivo em uma equipe de futebol deveria ser o respeito pelos fundamentos do esporte.
Talvez Dunga tivesse dificuldade para mensurar objetivamente o quanto cada jogador poderia agregar no campo de jogo. Ou, ainda, não tenha atentado para o fato de que a falta de comprometimento de outras ocasiões não se refletia em variáveis abstratas, e sim nos resultados do time. Um atleta que se apresenta acima do peso, por exemplo, não prejudica o time por sua devoção por uma dieta calórica, e sim porque sua contribuição para o trabalho coletivo é menor a que recompensa que recebe - a convocação para a Copa.
Especulações a parte, o aspecto importante a ser resgatado é que Dunga, em sua paranóia pela identificação dos jogadores "comprometidos" com os ideais da seleção, acabou errando na mão no controle de sua equipe. Preocupado em monitorar cada aspecto extra-campo, esqueceu-se de que a única variável que poderia controlar é a qualidade do resultado do esforço coletivo de sua equipe. Pior, superestimou a sua capacidade de impedir a entrada de "ovelhas negras" na seleção, como se essa fosse a decisão mais importante.
O futebol, assim como a maioria esmagadora das ações coordenadas na esfera social, tem na criatividade uma de suas maiores forças. Exagerar na dose do monitoramento dificilmente contribui para o êxito. A Coréia do Norte é uma prova viva no plano estatal; na esfera privada, dezenas de empresas com dificuldade de inovar o sentem diariamente. A seleção de Dunga, com sua exaltação do controle estrito, constitui mais uma evidência dessa realidade.
Material escrito por:
sylvia saes
Professora do Departamento de istração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)
ar todos os materiaisBruno Varella Miranda
Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri
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