O objetivo desse artigo é tecer algumas considerações quanto à evolução e perspectivas do preço de café, um assunto que sempre desperta grande interesse do cafeicultor, em especial, neste momento de forte ebulição do mercado, quando a euforia é permeada pela incerteza em relação à intensidade e duração desse novo patamar de preços, tornando o empreendedor na lavoura cafeeira ainda mais sensível ao planejamento e gestão de suas atividades comerciais e produtivas.
A Figura 1 mostra a evolução dos preços diários durante os três primeiros meses de 2011. Por ela verifica-se que o processo de aumento de preços, iniciado no ano anterior, continua e se torna ainda mais acentuado, alcançando valores recordes em mais de uma década. A interrogação que todos fazemos é: como, e até quando, essa evolução positiva de preços acontecerá?
Figura 1 - Preços diários do café de janeiro a março de 2011 e linha de tendência.

Fonte: CEPEA, 2011.
2 - A experiência do ado
Para início de nossa reflexão sobre as perspectivas futuras, é oportuno verificar o que nos ensina o ado. Vamos começar lembrando que os preços de um produto são determinados, principalmente, pela estrutura do mercado, pelos fundamentos de mercado (produção, estoque e consumo) e pelas expectativas dos agentes de mercado em torno dos desempenhos setorial e global no futuro. É com base nesses determinantes de preços que o café, pelas peculiaridades da sua produção e do seu mercado, apresenta três típicas flutuações ao longo do tempo. São elas:
a) A volatilidade, que reflete a intensidade e frequência das flutuações dos preços, no mercado de café. É observada, principalmente, nas cotações das Bolsas de Mercadoria, mas também ocorre no mercado físico, que apresenta mudanças diárias, como as registradas na evolução da linha azul da Figura 1. Essa flutuação demonstra a sensibilidade do produto às mudanças de informações nas questões políticas, de mercados e nos indicadores financeiros, nacional e internacional.
b) A flutuação sazonal, com periodicidade anual, que tem como causa principal os efeitos das estações do ano na produção e, em consequência, na oferta e na demanda do produto.
c) A flutuação cíclica, que ocorre a longo prazo e se repete com uma periodicidade mais ou menos constante ao longo do tempo. Essas flutuações são causadas pelas características das respostas da oferta e demanda do produto às variações de preços. No caso do café, os ciclos têm duração que variam de 6 a 8 anos.
Inicialmente, vamos analisar as informações de preço do café no ado recente. Pela Figura 2, observamos comparativamente como evoluíram os preços médios mensais deflacionados de café nos últimos 3 anos. As linhas, preta e verde mostram o comportamento médio dos preços mensais nos anos de 2008 e 2009, respectivamente. Nesses dois anos, o preço de café teve evolução sazonal semelhante e típica, com preços maiores no início e no final do ano e com preços menores no período de safra. A linha vermelha mostra o comportamento dos preços médios mensais em 2010. Por ela, podemos constatar que nesse ano houve uma mudança no patamar de preços e foi um ano atípico com relação à sua evolução sazonal, já que os preços iniciam um processo de subida em maio, no início da safra, e mantêm a tendência de alta até o final do ano.
Figura 2 - Preços deflacionados médios mensais do café nos últimos três anos

Fonte: ICO, 2011.
Agora, vamos esticar um pouco mais a nossa visão sobre o ado para podermos observar as variações cíclicas que ocorreram no preço de café nos últimos 15 anos. A Figura 3 nos mostra a evolução de preços corrigidos durante esse período. Por ela é possível verificar que os picos de preços do café - ocorridos em 1997/98 e 2005 - possuem duração de, no máximo, 2 anos. As duas alegações mais gerais para que isso venha ocorrendo são a rápida expansão da oferta pelos cafeicultores e a redução da demanda de café por parte de compradores. Em valores corrigidos para fevereiro de 2011, os picos de preços tiveram valores máximos de R$ 813,38 em maio de 1997, R$ 620,35 em dezembro de 1999 e R$ 458,22 em março de 2005. Para efeito comparativo, maior índice Cepea do atual período de alta, foi o preço de 09 de março de 2011, quando a saca de 60 kg de café foi cotada a R$ 551,60.
Figura 3 - Preços mensais deflacionados do café de setembro de 1996 a março de 2011

Fonte: CEPEA, 2011.
3 - Os fundamentos de mercado no presente
Se a análise do ado pode ser útil ao nos mostrar o comportamento histórico dos preços, precisamos tecer alguns comentários sobre os fundamentos de mercado no presente, antes de nos aventurarmos a lançar hipóteses sobre o futuro. As Figuras 4, 5 e 6, respectivamente, mostram a evolução da produção, estoque e consumo de café no mundo, nos 11 últimos anos.
Figura 4 - Produção mundial de café de 2000 a 2010.

Fonte: ICO, 2011.
Figura 5 - Estoques iniciais de café dos principais países de 2001 a 2010.

Fonte: ICO, 2011.
Figura 6 - Consumo mundial de café de 2000 a 2009.

Fonte: ICO, 2011.
Esses fundamentos de mercado, no conjunto, nos mostram que o balanço oferta versus demanda de café vem se tornando crescentemente apertado nos últimos anos, contudo, eles não indicam nenhuma forte escassez do produto que comprometa o abastecimento de café no curto prazo (ressalva pode ser feita para algum tipo especial de café). O estoque, que decresceu muito rapidamente e, segundo informações recentes, no caso brasileiro deve ser nulo em julho de 2011, pode ser reposto em poucos anos, dependendo da velocidade de resposta da produção mundial ao estímulo de preço.
4 - As expectativas quanto ao futuro
O olhar para o futuro destaca o papel das expectativas em torno da evolução dos fundamentos de mercado (produção, estoque e consumo) e do comportamento de outras variáveis também importantes na formação dos preços. Ao definir seu conjunto de ações do presente e do futuro, cada agente de mercado - produtor, indústria, exportador, etc. - elege seu próprio conjunto de variáveis importantes e tira delas suas conclusões.
As Bolsas de Mercadorias são um bom indicador da expectativa de preços futuros dos agentes de mercado. Nesse sentido, as cotações de café observadas nas Bolsas de Nova Iorque e na BM&FBovespa representam a expectativa de preço desse produto em datas posteriores. O Quadro 1, a seguir, mostra as cotações de café em diversas datas de vencimento ao longo deste ano. Por elas, verifica-se que a tendência altista nos preços, observada nos três primeiros meses de 2011 (Figura 1), não teve reflexo nas cotações futuras, uma vez que os valores observados decrescem levemente com o ar do tempo, ao contrário do que seria lógico esperar, uma vez que a manutenção do café ao longo do tempo tem custo, de armazenagem e financeiro, relativamente alto.
Quadro 1 - Preço futuro do café arábica na BM&FBovespa e em Nova Iorque

Fonte: Cooxupé (2011)
Obs. Cotação do dólar de 01/04/11 - R$1,6130/US$
5 - Conclusões
Fundamentados nas explanações feitas e considerando, como limitação, que não dispomos de uma "bola de cristal", ousamos elaborar as seguintes previsões para a evolução do preço de café, são elas:
a) A volatilidade do preço de café neste ano tende a ser maior, em função de fatores alheios ao setor, como, por exemplo, a crise do Oriente Médio, as dificuldades da economia japonesa, a crise econômica na Europa e a possibilidade de outros conflitos com reflexos nos preços de todas as commodities. Esta opinião também está fundamentada no estudo da CEPAL, da FAO e do IICA lançado no dia 2 de março deste ano, intitulado "Volatilidade de preços nos mercados agrícolas (2000-2010)" que, com base nesses argumentos, diz: "A volatilidade dos preços dos alimentos tem aumentado nos últimos meses e permanecerá alta no futuro próximo".
b) A sazonalidade do preço de café será típica durante o ano de 2011, porém num patamar mais elevado. Ou seja, teremos preços mais baixos do que os atuais no período da safra, os quais voltarão a aumentar nos 3 últimos meses do ano, possivelmente, em níveis mais elevado do que os atuais, tendo em vista a menor safra do ano em curso.
c) O preço de café encontra-se na parte alta do ciclo de longo prazo e esse, inexoravelmente, tenderá a baixar em determinado momento. A duração dessa fase dependerá, principalmente, da velocidade e intensidade da resposta da produção de café a esse padrão de preços. O setor estava desmotivado, foi pego de surpresa pelo aumento de preços e, em consequência, demorou a reagir não apresentando crescimento substancial de novas áreas plantadas em 2010/11. Contudo, segundo informações, é grande o número de sementes vendidas/encomendadas para a produção de mudas durante o ano de 2011, donde se deriva ser significativamente elevado o número de as novas áreas plantadas em 2011/12.
Nessa linha de raciocínio é importante considerar que a safra de 2012 será alta, pela bianuidade típica da cafeicultura brasileira, e certamente, será ainda mais inflada pelos bons tratos agronômicos que estão sendo dedicados às lavouras de café, principalmente, em termos de adubação e controle de ervas daninhas, pragas e doença. Pelas mesmas razões, a safra de 2013, esperado ano de baixa produção, possivelmente terá os efeitos da bianuidade amenizados em função da produção dos novos plantios e dos aumentos derivados dos bons tratos nos anos em curso. É importante dizer que não estamos levando em consideração a retração de consumo em decorrência do aumento do preço de café. Estamos confiando na decantada inelasticidade preço da demanda desse produto.
Se as coisas acontecerem como aqui previsto, teremos, com certeza, os bons preços de café até o ano de 2012 e, provavelmente, ainda em 2013, donde se estima que a flutuação cíclica comece seu processo de decréscimo mais uma vez, repetindo o fenômeno histórico já consagrado na economia cafeeira.
Por último, cabe-nos dizer que a nossa ousadia de perscrutar o futuro em um assunto tão polêmico quanto o preço do café, é um exercício que tenta mostrar uma das possibilidades de análise por meio da qual todos interessados podem fazer suas próprias prospecções utilizando o mesmo conjunto de informações, ou valendo-se de novas variáveis aqui não consideradas e, nesse exercício, chegar a resultados totalmente díspares. O planejamento empresarial não pode prescindir do desenho do cenário futuro, mesmo sabendo que ele comporta riscos e incertezas. Boa sorte para aqueles que também se atrevam a elaborar exercício semelhante.