Recentemente, dois relatórios de ONGs internacionais mostraram ao mundo casos de trabalho infantil e escravo em algumas fazendas de café do Brasil. Ambos foram publicados pouco antes de grandes eventos internacionais, o que fez alguns suspeitarem de intenções maliciosas para prejudicar a imagem do nosso café. Acredito que a intenção seja colocar em discussão a qualidade do trabalho nas lavouras para que o setor encontre soluções para os problemas ainda existentes, não só no Brasil, mas em todos os países produtores. E isso exige a participação dos demais elos da cadeia.
Na verdade, as empresas que supostamente compraram café colhido por menores de idade ou escravos modernos receberam mais atenção da mídia internacional do que o próprio Brasil. No Reino Unido, por exemplo, as notícias que saíram deram destaque para o posicionamento destas empresas e o que elas fariam a respeito.
Os consumidores na Europa e nos Estados Unidos estão cada vez mais conscientes sobre ética, meio ambiente e saúde, o que, entre outras consequências, está fazendo com que as empresas abandonem até os corantes artificiais em favor dos naturais na fabricação de alimentos. Essa tendência mais ampla foi analisada em outro artigo: http://goo.gl/8xkHTW
Neste exato momento, a indústria do chocolate enfrenta uma pressão imensa dos consumidores e ONGs, visto que as condições de trabalho em Gana e Costa do Marfim, os dois maiores produtores de cacau do mundo, são críticas. Estima-se em mais de 2 milhões o número de menores de idade trabalhando em condições precárias na produção de cacau nessas nações. Embora seja um problema cuja solução depende principalmente dos governantes locais, é sobre as ações dos fabricantes de chocolate que a indignação dos consumidores se faz presente.
Quanto ao café brasileiro, sua qualidade é reconhecida por toda a cadeia e as grandes empresas de torrefação conhecem a realidade das lavouras nacionais. A cada ano, centenas de profissionais estrangeiros ligados a exportadoras, torrefadoras e cafeterias visitam fazendas no país. Só a Universidade Federal de Lavras (Ufla) recebe dezenas de estudantes e profissionais na InovaCafé anualmente e eles ficam conhecendo toda a estrutura da Universidade voltada para o café. Todos eles sabem que os tais relatórios mostram as exceções que precisam ser combatidas, não a regra da cafeicultura brasileira.
O Brasil, hoje, é um grande fornecedor de cafés certificados, com importância estratégica para as torrefadoras comprometidas em comprar cada vez mais produto sustentável. Como exemplo disso, destaca-se que a Lavazza lançou uma nova linha de cafés sustentáveis para o segmento de hotéis e restaurantes:
São quatro opções com certificação Rainforest Alliance: três blends do Brasil e um da Tanzânia. Os relatórios das ONGs podem até comprometer a imagem do café brasileiro perante algumas pessoas (bem poucas, acredito), mas a realidade do mercado, evidenciada pela qualidade dos grãos nacionais, fala mais alto. E este é o melhor marketing que pode haver para o nosso café.
*Eduardo Cesar Silva é coordenador do Bureau de Inteligência Competitiva do Café Prof. do Departamento de sitração e Economia da Universidade Federal de Lavras (Ufla)