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Como a chuva durante a colheita impacta (ou não) o volume e a qualidade do café

A dificuldade de se pré-secar ou secar o café talvez seja o pior impacto do clima adverso na época de colheita sobre a qualidade do café. Por Carlos Henrique Jorge Brando, da P&A Marketing.

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Este artigo foi originalmente escrito para os leitores estrangeiros do boletim mensal da P&A, chamado Coffidential*. Em princípio, não queria publicá-lo no CaféPoint por considerá-lo ingênuo para o leitor brasileiro e, principalmente, para os participantes no agronegócio café, que conhecem sobejamente o que se apresenta em seguida. Entretanto fui convencido a publicá-lo pela própria equipa da P&A e por amigos experientes que argumentaram que é melhor correr o risco de ser redundante que omisso.
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O clima durante a colheita brasileira este ano tem sido mais nublado e chuvoso do que de costume. Ultraada a metade do período de colheita do arábica, o número de dias nublados e chuvosos já superou o de anos anteriores. O comentário peculiar, de que chuva nesse ponto da colheita faz com que mais café seja produzido e os preços consequentemente reduzidos, levou este artigo a ser escrito.

Foto ilustrativa: Alexia Santi/agencia ophelia/ Café Editora
 
Foto ilustrativa: Alexia Santi/agencia ophelia/ Café Editora

A chuva nesta fase do ciclo de produção não afeta o volume de café a ser produzido na presente safra. Os grãos já estão prontos para serem colhidos e o que muda é quando eles serão colhidos e quão logo serão processados e secados. A chuva e o tempo nublado impactam principalmente a qualidade do café colhido em tais circunstâncias. Tais impactos, que podem resultar de atrasos na colheita, no processamento e na secagem, podem no entanto ser minimizados com tecnologia moderna.

A chuva impede que o café seja colhido por motivos óbvios: colhedores não podem trabalhar e mesmo máquinas grandes – colheitadeiras mecânicas automotrizes – nem sempre conseguem operar. Pior ainda, como a maior parte de café brasileiro é colhida por trabalhadores trazidos de fora das fazendas, tempo nublado ou chuva pela manhã ou mesmo no dia anterior fazem com que muitos não compareçam ao trabalho, o que resulta em colheita prejudicada naquele dia mesmo que o tempo melhore. Atrasos na colheita fazem com que as cerejas amadureçam além do ponto ideal para serem despolpadas e trazem o risco de queda das cerejas já secas no pé, por efeito do vento ou de chuvas pesadas. O impacto na qualidade é obvio: menos café cereja descascado e despolpado e qualidade indesejada de bebida dos grãos coletados do chão, o que fica mais grave com o avanço da colheita e a possibilidade de mais cereja cair. Alta umidade por períodos extensos pode também causar ou intensificar a ocorrência de ferrugem e fermentação indevida dos grãos de café, sem contar com uma possível floração precoce.

Quando o processamento da safra atrasa, a diminuição da disponibilidade de cerejas maduras limita a produção de cafés cereja descascado e despolpado, que recebem prêmios de preços. Mesmo que o atraso na colheita faça com que a porcentagem de café verde diminua e os açucares se concentrem, é mais provável que muitas cerejas caiam e sofram os impactos negativos acima mencionados.

A dificuldade de se pré-secar ou secar o café talvez seja o pior impacto do clima adverso na época de colheita sobre a qualidade do café. Apesar do Brasil ser o país que mais emprega secagem mecânica, a secagem ao sol continua sendo importante em muitas regiões, a pré-secagem ao sol é um requisito quando se utiliza secadores e a qualidade da secagem ao sol é prejudicada pelas camadas de café cada vez mais grossas que se acumulam no terreiro e não podem ser removidas e podem forçar a colheita a ser interrompida. O café que permanece no terreiro quando chove pode sofrer fermentações indesejadas, o que resulta em características negativas da bebida apesar da existência de formas para se mitigar estes efeitos, como por exemplo revolver o café frequentemente durante os primeiros estágios da secagem e cobri-lo mais tarde. Estas soluções podem ser eficazes quando existe mão-de-obra e espaço disponíveis, o que não é o caso na maior parte do tempo e especialmente quando os dias chuvosos e nublados se sucedem. Tempo nublado pode danificar menos o café do que chuva, mas o congestionamento do terreiro também gera impactos negativos na qualidade.

Ainda que a mudança climática durante a época de colheita possa afetar o padrão de qualidade dos cafés brasileiros e diminuir a disponibilidade de cafés especiais e diferenciados como descrito acima, a evidência desta colheita até o momento é de que um melhor manejo, uma logística eficiente e o avanço nas técnicas de colheita, processamento e secagem ajudam a prevenir a perda de qualidade. Como é de se esperar, tecnologia e gerenciamento eficazes podem fazer maravilhas na mitigação dos impactos da mudança climática. Em resumo, a oferta brasileira de café provavelmente alcançará os níveis de qualidade usuais apesar do clima chuvoso que com certeza não irá aumentar o tamanho da presente safra. O tamanho médio dos grãos será menor, com consequente perda de peso, mas isto tampouco resulta da chuva na colheita mas sim do clima seco que a antecedeu.

* O Coffidential é publicado em inglês, espanhol, vietnamita, chinês, indonésio e português (para leitores lusófonos estrangeiros) e recebido por mais de 6,000 tomadores de decisão em mais de 100 países. Publicado desde 2007 e hoje em seu número 96, o Coffidential foi originalmente publicado somente em inglês e depois nos demais idiomas, citados acima em ordem cronológica do início da publicação.
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Material escrito por:

Carlos Henrique Jorge Brando

Carlos Henrique Jorge Brando

Engenheiro civil pela Escola Politécnica da USP; pós-graduação à nível de doutorado em economia e negócios no Massachusetts Institute of Technology (MIT), EUA; sócio da P&A Marketing Internacional, empresa de consultoria e marketing na área de café

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thiago de souza
THIAGO DE SOUZA

CRISTAIS - MINAS GERAIS - ESTUDANTE

EM 14/01/2018

Como faz para secar em lonas e sombrites, pois meu terreiro é de chão terreirão. Eu quero fazer este processo de secagem em lonas. Qual tipo de lonas poderei usar?
João Batista Vivarelli
JOÃO BATISTA VIVARELLI

DIVINOLÂNDIA - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 22/07/2015

Bom Dia.



Realmente este ano, estamos com com período de dias nublados longos,que certamente deverá impactar na qualidade, além da estiagem e calor ocorrido á partir de meados e Dezembro/2014 até final de Janeiro/2015, interferindo no tamanho dos grãos.

Como a chuva durante a colheita impacta (ou não) o volume e a qualidade do café

A dificuldade de se pré-secar ou secar o café talvez seja o pior impacto do clima adverso na época de colheita sobre a qualidade do café. Por Carlos Henrique Jorge Brando, da P&A Marketing.

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Este artigo foi originalmente escrito para os leitores estrangeiros do boletim mensal da P&A, chamado Coffidential*. Em princípio, não queria publicá-lo no CaféPoint por considerá-lo ingênuo para o leitor brasileiro e, principalmente, para os participantes no agronegócio café, que conhecem sobejamente o que se apresenta em seguida. Entretanto fui convencido a publicá-lo pela própria equipa da P&A e por amigos experientes que argumentaram que é melhor correr o risco de ser redundante que omisso.
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Foto ilustrativa: Alexia Santi/agencia ophelia/ Café Editora
 
Foto ilustrativa: Alexia Santi/agencia ophelia/ Café Editora

A chuva nesta fase do ciclo de produção não afeta o volume de café a ser produzido na presente safra. Os grãos já estão prontos para serem colhidos e o que muda é quando eles serão colhidos e quão logo serão processados e secados. A chuva e o tempo nublado impactam principalmente a qualidade do café colhido em tais circunstâncias. Tais impactos, que podem resultar de atrasos na colheita, no processamento e na secagem, podem no entanto ser minimizados com tecnologia moderna.

A chuva impede que o café seja colhido por motivos óbvios: colhedores não podem trabalhar e mesmo máquinas grandes – colheitadeiras mecânicas automotrizes – nem sempre conseguem operar. Pior ainda, como a maior parte de café brasileiro é colhida por trabalhadores trazidos de fora das fazendas, tempo nublado ou chuva pela manhã ou mesmo no dia anterior fazem com que muitos não compareçam ao trabalho, o que resulta em colheita prejudicada naquele dia mesmo que o tempo melhore. Atrasos na colheita fazem com que as cerejas amadureçam além do ponto ideal para serem despolpadas e trazem o risco de queda das cerejas já secas no pé, por efeito do vento ou de chuvas pesadas. O impacto na qualidade é obvio: menos café cereja descascado e despolpado e qualidade indesejada de bebida dos grãos coletados do chão, o que fica mais grave com o avanço da colheita e a possibilidade de mais cereja cair. Alta umidade por períodos extensos pode também causar ou intensificar a ocorrência de ferrugem e fermentação indevida dos grãos de café, sem contar com uma possível floração precoce.

Quando o processamento da safra atrasa, a diminuição da disponibilidade de cerejas maduras limita a produção de cafés cereja descascado e despolpado, que recebem prêmios de preços. Mesmo que o atraso na colheita faça com que a porcentagem de café verde diminua e os açucares se concentrem, é mais provável que muitas cerejas caiam e sofram os impactos negativos acima mencionados.

A dificuldade de se pré-secar ou secar o café talvez seja o pior impacto do clima adverso na época de colheita sobre a qualidade do café. Apesar do Brasil ser o país que mais emprega secagem mecânica, a secagem ao sol continua sendo importante em muitas regiões, a pré-secagem ao sol é um requisito quando se utiliza secadores e a qualidade da secagem ao sol é prejudicada pelas camadas de café cada vez mais grossas que se acumulam no terreiro e não podem ser removidas e podem forçar a colheita a ser interrompida. O café que permanece no terreiro quando chove pode sofrer fermentações indesejadas, o que resulta em características negativas da bebida apesar da existência de formas para se mitigar estes efeitos, como por exemplo revolver o café frequentemente durante os primeiros estágios da secagem e cobri-lo mais tarde. Estas soluções podem ser eficazes quando existe mão-de-obra e espaço disponíveis, o que não é o caso na maior parte do tempo e especialmente quando os dias chuvosos e nublados se sucedem. Tempo nublado pode danificar menos o café do que chuva, mas o congestionamento do terreiro também gera impactos negativos na qualidade.

Ainda que a mudança climática durante a época de colheita possa afetar o padrão de qualidade dos cafés brasileiros e diminuir a disponibilidade de cafés especiais e diferenciados como descrito acima, a evidência desta colheita até o momento é de que um melhor manejo, uma logística eficiente e o avanço nas técnicas de colheita, processamento e secagem ajudam a prevenir a perda de qualidade. Como é de se esperar, tecnologia e gerenciamento eficazes podem fazer maravilhas na mitigação dos impactos da mudança climática. Em resumo, a oferta brasileira de café provavelmente alcançará os níveis de qualidade usuais apesar do clima chuvoso que com certeza não irá aumentar o tamanho da presente safra. O tamanho médio dos grãos será menor, com consequente perda de peso, mas isto tampouco resulta da chuva na colheita mas sim do clima seco que a antecedeu.

* O Coffidential é publicado em inglês, espanhol, vietnamita, chinês, indonésio e português (para leitores lusófonos estrangeiros) e recebido por mais de 6,000 tomadores de decisão em mais de 100 países. Publicado desde 2007 e hoje em seu número 96, o Coffidential foi originalmente publicado somente em inglês e depois nos demais idiomas, citados acima em ordem cronológica do início da publicação.
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Carlos Henrique Jorge Brando

Carlos Henrique Jorge Brando

Engenheiro civil pela Escola Politécnica da USP; pós-graduação à nível de doutorado em economia e negócios no Massachusetts Institute of Technology (MIT), EUA; sócio da P&A Marketing Internacional, empresa de consultoria e marketing na área de café

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Como faz para secar em lonas e sombrites, pois meu terreiro é de chão terreirão. Eu quero fazer este processo de secagem em lonas. Qual tipo de lonas poderei usar?
João Batista Vivarelli
JOÃO BATISTA VIVARELLI

DIVINOLÂNDIA - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 22/07/2015

Bom Dia.



Realmente este ano, estamos com com período de dias nublados longos,que certamente deverá impactar na qualidade, além da estiagem e calor ocorrido á partir de meados e Dezembro/2014 até final de Janeiro/2015, interferindo no tamanho dos grãos.